19 de fev. de 2009

Deuses não digerem plástico


Viajar para lugares tão distintos como Estados Unidos, Nova Zelândia e Indonésia é, de fato, um baita choque cultural, principalmente em relação aos temas de sustentabilidade. Minha primeira semana na Califórnia foi suficiente para viver a cultura do desperdício. Pratos, pratinhos, pratões, bowls, talheres, copos, tampas de copos, canudinhos, saquinhos, sacões, garrafas plásticas... tudo é consumido e vai para o lixo num piscar de olhos. E pior, as embalagens são tão bonitas, algumas feitas com material reciclável, que dá vontade de guardar e usar de novo.
Eu não estava a fim de entrar no esquema “pegue-pague, consuma-jogue fora”, nem almoçar andando com um sanduba na mão, então resolvi sentar em uma lanchonete e tomar um milkshake, esperando que ele viesse no tradicional copo de vidro. Que nada! Veio em copo gigante de plástico, canudinho e uma baita tampa inútil estilo Os Jetsons. É difícil fugir do fast food. Existem alguns cafés onde você pode usar a sua própria caneca e ainda ganha desconto de 50 centavos de dólar, mas eles são raros de achar. Enfim, conclusão do GreenShort Stories sobre os Estados Unidos: ruas limpas, latas de lixo (lixo?) cheias.

Em Bali, as flores estão por todos os cantos. Enfeitam os templos, o cabelo das mulheres, as mesas dos restaurantes, as calçadas. Num pequeno pratinho feito de folha de coqueiro, flores, incenso, grãos de arroz e algumas comidinhas compõem um belo arranjo oferecido aos deuses. Milhares de oferendas se espalham pelas vilas e cidades todo santo dia. Depois, elas são varridas para o canto, jogadas no rio ao lado ou deixadas por lá. O mesmo acontece com as embalagens de comida: tigela feita de folha de bananeira dobrada e presa por palitinhos de bambu para o caldinho da comida não escorrer, saquinho feito de trama de folha de coqueiro com arroz cozido dentro... uma vez usados, vão pro chão. De acordo com a crença hindu, os deuses (ou seja, a natureza) se encarregam de dar um jeito no que não será mais usado. E isso, de fato, acontece. O que é da natureza, é absorvido por ela.
Mas quando o plástico e outros produtos artificiais entram em cena, a crença hindu fica obsoleta. Ninguém ensinou o balinês que o plástico não vai se decompor? Acho que a educação ambiental ainda não chegou pelas bandas de cá. Vá a uma das belas cachoeiras ou a um dos inúmeros rios de Bali pra ver que tristeza de sujeira. O povo amigo e devoto de Bali não foi informado de que os deuses não estão dando conta do recado.

13 de fev. de 2009

O outro lado do paraíso

Visitar Bali era um sonho antigo, era a imagem do paraíso: campos de arroz verdinhos, praias de águas cristalinas, ondas perfeitas (e surfistas), flores coloridas, templos hindus e um povo pacífico e espiritualizado.
No meu aniversário de 32, na Califórnia, ganhei de presente do Dudu um guia sobre Bali, de segunda mão e em perfeito estado – The natural guide to Bali - enjoy nature, meet the people, make a diference (ed Equinox), escrito por ecologistas e antropóplogos, com colaboração de jornalistas, sociólogos e artistas balineses que amam sua ilha mas tem lá um olhar crítico sobre Bali. O livro me conectou definitivamente com a Ilha dos Deuses ao trazer informações sobre lojas que praticam comércio justo, mercadinhos e restaurantes com produtos locais e orgânicos, fundações e cooperativas que apoiam as comunidades, etc, com um texto bem humorado e fluido como uma boa conversa (e que nenhum Lonely Planet tem). O guia perfeito para uma jornalista viajante em busca de histórias sobre sustentabilidde.
O texto sobre pirataria - Copyright or right to copy? - fala das marca de bolsas Guci, relógios Relex e câmeras Nilkon que vamos encontrar pelas ruas da muvucada Kuta. O guia explica que o balinês é artista por exelência porque faz arte para os deuses, mas o boom de artesãos tem arruinado a agricultura e a cultura local. O artesanato gera, por ano, U$ 1,5 bilhões e isso explica porque muitos pequenos agricultores trocaram de profissão e venderam suas terras para financiar uma lojinha de artesanato nos centros turísticos. Já viu um porta CD em forma de gato e pintado com cores vibrantes Made In Bali? Pois é um bom exemplo da massificação e distorção da arte, alimentada pela demanda nervosa dos centros consumidores mundiais. Um viajante atento a essas questões vai se deliciar com o Natural Guide ao ler sobre a importância do comércio justo em lugares tão explorados como Bali.
Daí, já ligado no movimento do lugar, você pode seguir a recomendação do guia de que a melhor parte da viagem é quando as coisas não acontencem como o planejado. Get lost!